Agência Brasil – Abolição da escravatura (1888), Proclamação da República (1889), autorização para o voto feminino (1932), as constituições do País… Das mais importantes decisões que mudaram a história do Brasil àquelas corriqueiras, tudo precisa estar publicado. Até 2017, inclusive, impresso em papel. Esses registros estão eternizados nas páginas do Diário Oficial (que ganhou o sobrenome “da União” em 2001).
Quem visita a Imprensa Oficial e o Museu da Imprensa, em Brasília, faz mais do que uma viagem no tempo. Visita também as transformações épicas. Desde a primeira edição em 1º de outubro de 1862 (há 159 anos), os tipos gráficos e os papéis amarelados revelam “Brasis” diferentes e uma infinidade de aulas de história.
A primeira edição do Diário Oficial
Aliás, a primeira edição defende o espírito apartidário do novo jornal. “Não será o Diário Official um novo combatente das lides políticas nem polemista nas questões que se discutirem (…) Outra é a missão que nos foi incumbida: o que os leitores devem esperar de nós é a revelação da marcha do Governo, para que por ella possam os competentes julgá-lo”. Vigorava à época o governo imperial de Dom Pedro II. Nesta primeira edição, foram quatro páginas.
Entre as informações, o Ministério da Guerra avisou sobre uma vaga para ser preenchida por concurso: ajudante do Guarda-Mor na Alfândega da Côrte. Avisava também que alunos de botânica da Escola Central iriam até o Museu Nacional para estudar. O Ministério da Marinha ordenava que o Vapor Magé deveria estar pronto o quanto antes para levar objetos do Rio de Janeiro até Santos. A Repartição de Polícia anunciava a prisão de pelo menos sete escravos por motivos como embriaguez ou estar nas ruas fora do horário previsto.
Foi o mesmo veículo que registraria as transformações, pouco a pouco, desse Estado escravagista. “Considero, entre as edições mais importantes, a publicação da Lei do Sexagenário (1885) e a Lei do Ventre Livre (1871). O Diário Oficial guarda essas transformações do Brasil”, explica o historiador da Imprensa Oficial Rubens Cavalcanti Junior.
Sem parar
O atual diretor da Imprensa Oficial, Heldo Fernando de Souza, enfatiza que a publicação do jornal tem repercussão no país inteiro em um rotina que não para. “Chegamos a publicar quatro mil materiais em um dia em uma confecção diuturna. Começamos as publicações no início da tarde e trabalhamos até umas 5h da manhã. São cerca de 40 pessoas que trabalham diretamente nessa atividade anônima, mas altamente significativa porque repercute na Nação toda”, afirma. Hoje o jornal é publicado apenas na versão online, o que significou mudanças de rotinas porque publicações podem ser feitas imediatamente depois de chegarem de órgãos oficiais.
Nos tempos da impressão, as gráficas chegaram a ter mais de dois mil trabalhadores, que foram se aposentando. “Vamos homenagear essas pessoas que são os construtores do Diário Oficial, tanto aqueles que já aposentaram, como os que ainda trabalham”.
Transições
O processo de passagem do impresso para o eletrônico começou a ser trabalhado em 1997. De acordo com o coordenador de Publicação e Divulgação, Alexandre Machado, a mudança concluída integralmente em 2017 com a exclusividade da versão digital, representou economia de recursos na ordem de R$ 10 milhões por ano (o que incluíam impressão e distribuição). “O órgão tem um orçamento geral de R$ 40 milhões. E essa economia representa 25% dos recursos, o que é muito significativo. A equipe de tecnologia de informação precisou ser reforçada para dar conta dessa missão”. Graças às inovações, há três anos, é possível acessar o Diário Oficial por aplicativo também.
“O Diário Oficial é um instrumento de Estado essencial para transparência pública e exercício da cidadania. O nosso alvo é a sociedade para que se faça o controle social. A partir da publicação tem eficácia e efeito jurídico”, afirma Machado.
Decisões como repasses de verbas ou nomeações têm obrigatoriamente que passar pelo Diário Oficial. Por isso, no país inteiro, gestores públicos e cidadãos comuns aguardam ansiosamente as publicações. “A nossa responsabilidade é muito grande porque as decisões somente são aplicadas depois da publicação”, testemunha o coordenador de editoração e divulgação eletrônica dos jornais oficiais, Helder Oliveira.
Economia de recursos
Antes de 1862 (desde a implantação da Imprensa Régia, em 1808), as decisões eram publicadas em diferentes veículos, inclusive os privados. A Gazeta do Rio de Janeiro, de setembro de 1808, foi o primeiro jornal impresso no Brasil com quatro páginas, utilizando os equipamentos da Imprensa Nacional. “Na época, também foi uma forma de economizar recursos”, afirma o historiador Rubens Cavalcanti Junior.
“Não temos registro nenhum de interrupção de publicações desde 1862 até hoje. Passamos por adversidades como todos os lugares. Já fizemos jornal no escuro, trabalhamos com água na canela em dia de chuva muito forte e até um tremor de terra em Brasília não parou os trabalhos. Em dias de greve, foram contratados terceirizados para que o jornal nunca deixasse de publicar”. O atual prédio da Imprensa Oficial é de 1960, construção que o então presidente Juscelino Kubitschek fazia questão que fosse a sede da edição do Diário Oficial que anunciasse a nova capital.