A Câmara dos Deputados aprovou na noite desta 3ª feira (6.mar.2021) o PL (projeto de lei) 948 de 2021, que afrouxa as condições para a iniciativa privada comprar vacinas contra o coronavírus.
O texto-base foi aprovado por 317 votos a 120, com 2 abstenções. Ainda faltam ser analisados 4 destaques, trechos deliberados separadamente. Isso significa que a proposta ainda pode ser alterada. Esses trechos devem ser discutidos nesta 4ª (7.mar).
A relatora foi a deputada Celina Leão (PP-DF). Leia a íntegra (146 Kb) do texto aprovado, elaborado por ela.
A proposta permite que pessoas jurídicas de direito privado comprem substâncias aprovadas pela Anvisa “ou por qualquer autoridade sanitária estrangeira reconhecida e certificada pela Organização Mundial da Saúde”.
Hoje, nem a iniciativa privada e nem o governo podem comprar vacinas sem a avaliação da Anvisa.
Além disso, os entes privados que adquirirem imunizantes são obrigados a doar todos para o sistema de saúde público enquanto não forem vacinados todos os integrantes dos grupos prioritários, como idosos. Atingida essa marca, as doações passam a ser de 50% das doses.
O texto aprovado pela Câmara nesta 3ª desobriga a doação de todas as doses. Se a proposta passar a vigorar, ainda existirá obrigação de doar ao SUS. A fração, porém, será de 50% independentemente de os grupos prioritários do programa público terem sido imunizados ou não.
A proposta determina que a substância adquirida por empresas seja destinada à aplicação gratuita em seus empregados e outros grupos de trabalhadores que lhes prestem serviço. Os critérios de prioridade de aplicação do sistema público devem ser usados dentro do universo das empresas.
Há, porém, uma restrição: “As aquisições feitas pelas pessoas jurídicas de direito privado com os laboratórios que já venderam vacinas ao Ministério da Saúde só poderão ser pactuadas após o cumprimento integral dos contratos e entrega das vacinas ao Governo Federal”.
“Tivemos o cuidado de colocar isso no nosso texto para que essa narrativa de que nós vamos, com a iniciativa privada, inflacionar preço ou contratar as doses já pactuadas com o SUS”, disse Celina Leão no plenário.
Os entes privados que quiserem comprar vacinas também podem esbarrar em outro obstáculo: os fabricantes têm dado preferência, nas vendas, para governos.
A parte sobre o licenciamento por agências de saúde teve interpretações diversas por técnicos legislativos ouvidos pelo Poder360.
O texto traz o seguinte trecho. O Poder360 grifou em amarelo a parte que fala sobre as agências estrangeiras:
Art. 2º As pessoas jurídicas de direito privado, individualmente ou em consórcio, ficam autorizadas a adquirir vacinas contra a Covid-19 que tenham autorização temporária para uso emergencial, autorização excepcional e temporária para importação e distribuição ou registro sanitário definitivo concedidos pela Anvisa, ou por qualquer autoridade sanitária estrangeira reconhecida e certificada pela Organização Mundial da Saúde, ou contratar estabelecimentos de saúde que tenham autorização para importar e dispensar vacinas, desde que.
A OMS (Organização Mundial da Saúde) tem gradações em sua certificação. Isso é citado em ao menos uma lei anterior, a 14.124. É o texto que obriga a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) a avaliar vacinas e medicamentos aprovados pelos seguintes órgãos. O Poder360 também grifou a parte que cita as gradações:
I – Food and Drug Administration (FDA), dos Estados Unidos da América;
II – European Medicines Agency (EMA), da União Europeia;
III – Pharmaceuticals and Medical Devices Agency (PMDA), do Japão;
IV – National Medical Products Administration (NMPA), da República Popular da China;
V – Medicines and Healthcare Products Regulatory Agency (MHRA), do Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte;
VI – Ministry of Health of the Russian Federation, da Federação da Rússia;
VII – Central Drugs Standard Control Organization (CDSCO), da República da Índia;
VIII – Korea Disease Control and Prevention Agency (KDCA), da República da Coreia;
IX – Health Canada (HC), do Canadá;
X – Therapeutic Goods Administration (TGA), da Comunidade da Austrália;
XI – Administración Nacional de Medicamentos, Alimentos y Tecnología Médica (ANMAT), da República Argentina;
XII – outras autoridades sanitárias estrangeiras com reconhecimento internacional e certificadas, com nível de maturidade IV, pela Organização Mundial da Saúde (OMS) ou pelo International Council for Harmonisation of Technical Requirements for Pharmaceuticals for Human Use – Conselho Internacional para Harmonização de Requisitos Técnicos para Registro de Medicamentos de Uso Humano (ICH) e pelo Pharmaceutical Inspection Co-operation Scheme – Esquema de Cooperação em Inspeção Farmacêutica (PIC/S).
Alguns técnicos entendem que, caso o texto do relatório passe a vigorar, será utilizado o critério estipulado na lei 14.124. Outros julgam que poderão ser compradas pela iniciativa privada no Brasil vacinas aprovadas por qualquer das agências listadas pela OMS, mesmo as de menor prestígio.
“Eu coloco a possibilidade de comprar automaticamente, de qualquer organismo internacional que seja aprovado pela OMS”, disse Celina ao Poder360. Se forem consideradas apenas as autoridades sanitárias que o organismo internacional considera referência, serão as seguintes:
- BGTD (Canadá)
- CECMED (Cuba)
- COFEPRIS (México)
- EMA (Europa)
- FDA (Estados Unidos da América)
- KFDA (Coreia do Sul)
- TGA (Austrália).
A Anvisa também é considerada referência na área pela OMS.
O PT tentou retirar do texto a possibilidade de compra sem licença da Agência Nacional de Vigilância Sanitária.
O deputado Alexandre Padilha (PT-SP), que foi ministro da Saúde quando o PT esteve no poder, disse que era necessário impedir a seguinte situação:
“Empresário que comprar essa vacina aplicar tanto em si quanto nos seus trabalhadores uma vacina de baixa qualidade, que não foi reconhecida em nenhum dos grandes países do mundo”
“Qualquer autoridade sanitária de qualquer canto nesse mundo, se tiver uma vacina reconhecida naquele país, o empresário pode comprar essa vacina e aplicar nos seus trabalhadores sem qualquer avaliação da Anvisa”, disse Padilha.
O projeto, para vigorar, ainda precisa de análise do Senado. Depois, de sanção presidencial.